sexta-feira, 6 de março de 2009

Vida Escolar

 

Família

 

Vovó foi professora durante toda a vida profissional, hoje aposentada pelo Estado de São Paulo. Mulher que desafiou os preconceitos da época para trabalhar fora e ter a sua independência financeira. Trabalhou por muitos anos nas escolas distantes dos centros urbanos, voltando para casa e para seu marido e filhas apenas nos finais de semana, sendo seu compromisso maior levar educação para as crianças da área rural. Mamãe seguiu seus passos. Largou a faculdade de biologia para terminar o magistério e lecionar nas escolas do subúrbio de São Paulo. As dificuldades encontradas nos meios menos favorecidos nem sempre são fáceis de serem encaradas, então quando viemos para Florianópolis, em 1990, mamãe preferiu suportar os caprichos da elite. Papai nunca foi um homem de muitos estudos. Tem o segundo grau e só, um trabalhador padrão. Muitas vezes acaba sendo uma decepção para seu filho, pequeno burguês, estudante da universidade federal e elite cultural do país, devido à ausência de conhecimentos próprios da academia. Nada de mais, apenas um desentendimento entre categorias: estudante e trabalhador.

 

Instituição

 

Aos 6 cheguei em Florianópolis, entrando para a escola que, supostamente, era a melhor escola da cidade e até os 15 foi educado entre as melhores, ou melhor, as mais ricas crianças da paróquia. Não é fácil para uma criança ter de ficar em casa nas férias enquanto seus amigos vão para a Disney.

 

Os professores, por outro lado, eram as criaturas mais insignificantes da instituição. Todas mulheres, suburbanas, mal casadas, semi-analfabetas. A lógica da administração era a seguinte: economiza-se com o corpo docente e se investe em estrutura e planos mirabolantes, como mandar os estudantes para os States por 2 meses (sim, esses projetos eram pagos, mas a escola conseguia se endividar assim mesmo, atrasando o pagamento dos professores todos os meses).

 

Na teoria é sempre tudo muito lindo. Escola alternativa, ensino construtivista, sua sede principal era num sítio longe do centro, com cavalos, piscina e coelhos, pena que estes atrativos eram mais coisas de vitrine, pois raramente tínhamos acesso a esses privilégios. A lembrança mais viva que tenho dos cavalos é de certa vez que um vizinho invadiu a escola no final de semana e enfiou alguma espécie de pau na vagina da égua. Ela teve de ser sacrificada. Não lembro o nome dela. Era o xodó da escola.

 

Não lembro de muitas brigas entre os estudantes, mas a violência psicológica era constante. Bullying era hobby entre os mais descolados. Nunca ri tanto na minha vida quanto ri certa vez na qual um menininho de uns 7 anos estava fazendo suas necessidades no banheiro quando um grupo numeroso de alunos com seus 14 anos entraram no banheiro e arrombaram sua porta, rindo e xingando.

 

Ah, detalhe, eu era bolsista, filho da professora, e todas as crianças sempre valorizavam esses pormenores.

 

Sujeito Escolarizado

 

Mas não sejamos ingratos, graças a esta escola hoje eu sei ler, escrever, tabuada e sei também identificar e evitar o contato com pessoas não tão interessantes. Baseado na teoria do milagre consegui desenvolver meu senso crítico e reverter o processo durante minha adolescência. A rebeldia dos 16 foram para mim um santo remédio.

 

Faço das palavras de Bernard Shaw as minhas: “the only time my education was interrupted was when I was in school”.

2 comentários:

Anônimo disse...

O cotidiano escolar neste contexto é muito edificante!

Viva o Brasil!

Mariana disse...

é foda ler isso aqui enquanto preparo um trabalho de didática sobre as tendências pedagógicas liberais. pequenos e tediosos manuais furados sobre como extrair o que se quer de corpos e cabeças. afora meu desapego à licenciatura, terei de passar pela fase professora. e agora, que camisa vestir? postura renovadora numa realidade mais que tradicional? chega a me dar uma vertigem...